RAFAELA

Trabalhar numa empresa de limpeza de condomínio, morar de aluguel, sustentar e cuidar de uma tia acamada, filho e sobrinha pequenos sempre foi uma tarefa muito árdua para Rafaela. Equilibrar tantas responsabilidades e ainda poder sonhar em adquirir a casa própria era algo muito distante de sua realidade.

Uma reportagem na televisão que mostrava a ocupação da Fazendinha em Vitória, a situação das famílias ali instaladas e uma liderança informando que estava demarcando os lotes e recebendo famílias diariamente, mudou sua perspectiva e despertou o desejo de buscar pelo direito pela casa própria. 

“Tinha visto na televisão que eles tinham ocupado o terreno chamado Fazendinha lá na Grande Vitória. Aí eu falei nossa eu vou lá ver se eu consigo um pedacinho de terra pra mim”, relata Rafaela sobre o início de sua jornada na luta por moradia iniciada em 2017.

 

Após conseguir um lote e começar a planejar a construção da casa, uma ordem de despejo chegou 4 meses depois e os planos precisaram ser alterados. Algumas das famílias que estavam na Fazendinha foram encaminhadas para Casa do Cidadão, em Vitória. Sem o apoio do Estado e sem onde ir, as pessoas se organizaram para buscar imóveis vazios com o objetivo de ocupar um espaço em que pudessem viver, dada as condições de extrema dificuldade em sustentar um aluguel na capital do estado. 

Ao encontrar o prédio histórico do Instituto de Aposentadorias e Pensões do Industriários (IAPI), no centro de Vitória, que estava há muitos anos fechado e sem nenhum projeto direcionado à função social, as famílias se organizaram e ocuparam o prédio, conseguindo se estabelecer por 4 meses.

Esse movimento gerou uma pressão junto ao poder público, acarretando no despejo das famílias sem cumprir os critérios de reintegração de posse e, novamente, marcado pela ausência dos aparatos de direitos do Estado.

Em meio a essas histórias e movimentações, Rafaela se constrói como uma liderança de relevo no âmbito da luta por moradia em Vitória, ganhando repercussões importantes nas pautas de luta por direitos humanos e habitação na capital.

Entre outras mudanças e ocupações temporárias, os caminhos de Rafaela cruzaram-se com os de muitas famílias que se organizaram como Ocupação Chico Prego. 

Segundo Rafaela, muitas vitórias foram conquistadas nesses dois anos e cinco meses de permanência no prédio do Cine Santa Cecília: “Ali foi uma vitória muito grande né porque o juiz foi um juiz muito sensível a causa falou que se a gente sair do local a gente teríamos que ter pelo menos uma moradia digna” destaca Rafaela.

Contudo, mais uma ação de despejo controversa marcou a trajetória dessas famílias e de Rafaela. Para além do trabalho de cuidado e organização da Ocupação Chico Prego, Rafaela esteve sempre à frente de solicitações de diálogo junto ao poder público, no entanto, sem muitas ocasiões de abertura para tal. Diante da ausência de negociações, bem como do aparato do estado para suas tantas necessidades, uma nova ocupação foi realizada, dessa vez na Escola Irmã Jacinta. Mais um despejo, mais uma decisão difícil para a liderança de Rafaela.

Em meio à pandemia de COVID 19 e o acirramento das precariedades as famílias da Chico Prego direcionam-se para a frente da Prefeitura Municipal de Vitória (PMV), em um acampamento-protesto-ocupação que durou aproximadamente quatro meses. As repercussões dessa movimentação ganharam as páginas dos jornais e mídias sociais, reconhecendo o trabalho incessante de Rafaela junto às lutas por moradia no estado.

A história de Rafaela se entrelaça com sua presença junto à Ocupação Chico Prego, anunciando sua coragem em denunciar as negligências do Estado. A história do Movimento de Moradia no ES é marcado por Rafaela, que representa em sua trajetória tantas outras mulheres, mães, avós, que se juntam à esse movimento de luta em busca de moradia digna e demais direitos assegurados.

Fotos por Isabele Colares