Liderança
Ser uma liderança implica em assumir a dianteira tanto em relação ao manejo da organização interna do cotidiano da ocupação, quanto à coordenação dos processos de gestão e de tomada de decisão.
“PRA VOCÊ APRENDER O QUE EU APRENDI, NÃO É LIVRO QUE ENSINA, É A PRÁTICA”
Maria Clara
“É assim que a gente vai criando força pro fazer as coisas pro povo.”
Dona Maria Clara afirma que é preciso juntar as pessoas. Para ela, construir liderança é um passo importante na luta por acesso à direitos e isso se faz no cotidiano, no processo de estar junto, na presença ativa diante dos contextos de disputa por direitos. Maria Clara remete a formação de lideranças à uma força, “um espírito de fazer algo pra trazer pra este grupo”. “Aí assim a gente vai juntando as pessoas. Vai juntando as pessoas e dentro desse grupo vai aparecendo pessoas que tem esse espírito de dizer ‘assim não’!”. Os espaços de discussão, as reuniões, a participação de diferentes setores da sociedade, são elementos importantes na perspectiva de Dona Maria, para a construção de uma base fortalecida de luta pela moradia. Em sua trajetória, atuou (e atua) como liderança fundamental no Espírito Santo, reunindo famílias, atentando-se às demandas das mulheres, fomentando os trabalhos de base da Igreja Católica, juntando-se à parcerias dispostas a transformação das desigualdades impostas e formando o Movimento Nacional de Luta pela Moradia no estado.
Rafaela
“Pra você aprender o que eu aprendi, não é o livro que ensina, é a prática. E os instrumentos que eu fui aprendendo a usar, não foi feito por máquina, foi construído a mão, foi eu própria que construí.”
Rafaela nos conta que, ao organizar-se como ocupante, não tinha o desejo de assumir qualquer posição de liderança. Porém, ela nos diz que sempre foi curiosa e questionadora, vendo-se, por diversas vezes, tomando a frente nos processos decisórios e de gestão da ocupação. O seu despertar também foi percebido por outras figuras de referência, como Maria Clara, que a orientou no processo formativo de tornar-se liderança. Com base em sua experiência, Rafaela percebe que questões de gênero marcam a construção dessa posição. Ela afirma que “às vezes a mulher vai parar numa liderança não é porque ela quer. Ela vai às vezes por falta de opção. Ela vai vê a situação errada, ela quer se impor naquela situação”. Atrelado a isso, ela nos relata sobre os desafios impostos pelo machismo nas disputas de poder a partir de experiências em que sua posição foi questionada. “O homem, ele odeia receber regras de mulheres”, diz Rafaela. Apesar de em alguns momentos indagar-se sobre a continuidade do seu trabalho à frente da ocupação, Rafaela narra que uma das coisas que a mantém fortalecida é a trajetória construída ao longo de todos esses anos, “porque pra você aprender o que eu aprendi, não é o livro que ensina, é a prática”.
Baiana
“Aí eu dei coragem para que o povo fosse pra cima”
O processo de tornar-se liderança, na trajetória de Baiana, acontece de forma espontânea a partir da construção e fortalecimento de vínculos de confiança com a comunidade. “Eu acho que o povo me convida, me chama e eu vou resolver”. Ela nos conta que o exercício dessa função envolve a força e a coragem necessárias para a afirmação da luta e a disponibilidade e prontidão para resolução dos desafios que movimentam a vida nos contextos de ocupação. Seja no processo de organização da ocupação, na construção de estratégias de acesso a direitos, na promoção de atividades para a comunidade, nas articulações políticas ou enfrentamentos judiciais, Baiana afirma-se enquanto uma líder engajada e comprometida com a disputa pela terra e a afirmação das vidas dos ocupantes. “Com o facão na mão” para abrir ruas e demarcar lotes, Baiana aposta numa liderança que põe a mão na massa e convoca todos para a luta: “Gente, corre, a hora é essa”. “Corre todo mundo, vamos pra cima, vamos pra cima”.